segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Ermida de Santo Ambrósio, em Santa Isabel (Lisboa)


Fig. 1

Na imagem acima publicada apresentamos o prospecto da desaparecida Ermida de Santo Ambrósio, que ficava em Lisboa, na rua do mesmo nome, actual Rua D. Dinis, entre a Rua do Sol ao Rato e o início da Rua da Arrábida, na freguesia de Santa Isabel (Campo de Ourique).



Embora Norberto de Araújo indique esta capela como edificada em 1731 (ARAÚJO, 1993 : 64), os autos existentes no Fundo da Câmara Eclesiástica de Lisboa (Torre do Tombo), assim como a licença existente nos Livros de Registo da Câmara Patriarcal de Lisboa (Arquivo Histórico do Patriarcado), indicam que a mesmo foi edificada em 1738, sendo dada licença para ser visitada, benzida e aprovada por Provisão de 11 de Junho de 1738, conforme documento que publicamos no fim deste texto.

Teve esta ermida a particularidade de ter funcionado como sede da paróquia de Santa Isabel desde 14 de Maio de 1741, então criada por D. Tomás de Almeida (CASTRO, 1763 : 291, 297), isto enquanto se construía 1.ª fase da Igreja paroquial, obra do arquitecto Rodrigo Franco, depois concluída por Carlos Mardel. Foi ainda sede da paróquia da Encarnação logo a seguir ao terramoto de 1 de Novembro de 1755 (SEQUEIRA, 1916 : 75).

O fundador da ermida foi Ambrósio Lopes Coelho (1704 + ?), natural de Lourinhã, homem de negócios da Praça de Lisboa, contratador da Casa da Portagem (1740) e proprietário do ofício de Meirinho do Mar, Ribeira e armazéns de Lisboa. Este rico comerciante — homem de fartos haveres — como mais tarde se mencionará na habilitação na Ordem de Cristo de um seu familiar, além dos ofícios que teve, já em 1735 comerciava bens do Brasil, sobretudo «patacaria e prata», para a China e para outras regiões do Oriente.

Segundo informações que nos foram gentilmente cedidas pelo Dr. Gonçalo Monjardino Nemésio, eminente investigador das famílias portuguesas de origem italiana, Ambrósio Lopes Coelho, viúvo de Isabel Maria da Fonseca, casou em 2.ªs núpcias em 1734, na fregª do SS.mo Sacramento, Lisboa, onde era morador, com D. Joana Joaquina Jorge, uma das filhas de João Jorge (Jori), sem dúvida o mais rico comerciante de Lisboa na época de D. João V, que sendo natural da província de Milão veio para Portugal no início do século XVIII, estabelecendo-se na Rua da Junqueira, Belém, onde comerciava para as províncias portuguesas ultramarinas bens diversos, mas em especial vinhos.
A filha deste casal, Maria Luísa Albertoni, nasceu na mesma freguesia do Sacramento em 1745, e segundo o mesmo investigador, em 19 de Fevereiro 1765 “na Hermida de S. João Baptista, das Cazas de Paulo Jorge (ou Jori)”), casou com Policarpo José Machado (I), vindo este casal a ser pais de extensa prole, entre eles:
- Maria Teresa Machado c.c. Daniel Gildemeester;
- Caetano José da Gama Machado c.c. Ana Florência Bandeira;
- Francisco José da Gama Machado c.c. Joana Francisca Jorge;
Policarpo José Machado (II);
- António Francisco Machado c.c. Ana Maria Cleofa Pereira Caldas, pais de Policarpo José Machado (III) (1796+1875), 1.º Visconde de Benagazil, que foi um político, empresário agrícola e comercial, militar e filantropo português.
 

Fig. 2

O chão onde se achava a Ermida de Santo Ambrósio, propriedade de Ambrósio Lopes Coelho, era um prazo de casas por detrás do chamado Convento das Trinas de Campolide, vulgo Trinas do Rato (vide Fig. 2), e após a morte deste veio a ficar na posse dos seus herdeiros até que em 1825 a quinta e casas de Santo Ambrósio, incluindo uma pequena vila operária (mais tarde conhecida pela Vila Visconde de Santo Ambrósio), foram colocados à venda, conforme anúncio da Gazeta de Lisboa de 16 de Julho desse ano:
«Vende-se hum prazo emfateuzim perpétuo, situado nesta Cidade na rua de Santo Ambrosio N 56, Freguezia da Santa Isabel, que se compoe de duas propiedades nobres com Ermida no centro, com huma quintinha arruada de latadas, muitas parreiras, árvores de fruta e vinha e varias propriedades реquепаs para accommodação de quinze moradores, quem o pretender, pode dirigir-se ao mesmo prazo no dito N.º 56».

Em 1864 parece que pertenciam ao Visconde de Rio Pardo, que nesse ano, em 11 de Agosto, alcançou uma «Provisão de Licença para na [sua] Ermida [sita na Rua de St.º Ambrósio com porta para a Rua que já serviu de Igreja Paroquial], no distrito da freguesia de Santa Isabel haver Sacrário com o Augusto Sacramento da Sacristia».

Este templete setecentista desapareceu quando Francisco António Namorado (Elvas, 1828 + Lisboa, 1904), médico da câmara do rei D. Luís e político do Partido Regenerador, depois Visconde de Santo Ambrósio, adquiriu estas casas e as reedificou já sem a capela, no ano de 1867, segundo prospecto do arquitecto Domingos Parente da Silva, de que se publica cópia onde se identifica a antiga capela e a nova fachada para a Rua de Santo Ambrósio, uma das duas para onde este palacete confrontava, sendo a outra a Rua do Sol ao Rato.

Notava bem Norberto de Araújo que esta ermida teve a particularidade de dar o nome a uma rua, Rua de Santo Ambrósio, rua que por sua vez deu o nome a um título nobiliárquico, Visconde de Santo Ambrósio, o qual por sua vez veio dar origem à nova designação da mesma a rua no fim do século XIX, Rua do Visconde de Santo Ambrósio, nome que esta rua manteve antes ser alterado para o actual, Rua D. Dinis, na década de 1920.
(ARAÚJO, 1938 : 67)

Rui Manuel Mesquita Mendes
Caparica, 28 de Setembro de 2015


FONTES:
Arquivo Municipal de Lisboa, Expediente, Prospetos, PT/AMLSB/CMLSB/ADMG-E/08/1074, pub. http://arquivomunicipal2.cm-lisboa.pt/xarqdigitalizacaocontent/Documento.aspx?DocumentoID=76557&AplicacaoID=1
Lisboa, Torre do Tombo, Câmara Eclesiástica de Lisboa, mç. 1808, doc. s/n de 11-6-1738.
Gazeta de Lisboa, 16-7-1825.
Arquivo Histórico do Patriarcado de Lisboa, Registo Geral de 1738 e Expediente de 1864.

BIBLIOGRAFIA:
ARAÚJO, Norberto de – Peregrinações em Lisboa, vol. 2, 1938.
ARAÚJO, Norberto de – Peregrinações em Lisboa, vol. 11, 1993.
CASTRO, João Baptista de – Mappa de Portugal, vol. 3, 1763.
FOLQUE, Filipe – Atlas da carta topográfica de Lisboa: Carta n.º 26, 1857.
SEQUEIRA, Gustavo de Matos – Depois do terremoto, vol. 1, 1916.

SITES:

IMAGENS:
Fig. 1: Prospeto do prédio que Francisco António Namorado pretende alterar na rua do Sol ao Rato, fazendo frente para a rua de Santo Ambrósio, 1867 (PT/AMLSB/CMLSB/ADMG-E/08/1074)
Fig. 2: Excerto do Atlas da carta topográfica de Lisboa: Carta n.º 26, 1857.

DOCUMENTOS:
«Emm[inentíssim]o e R[everendíssimm]o Sr.
Diz Ambrozio Lopes Coelho que elle tem feito huã Hermida junto ao Convento das Relligiozas de Campo Lide Extramuros desta cidade dedicada ao Dr. da Igreja o Sr. St.º Ambrozio, a qual se acha prompta e preparada para nella se poder cellebrar o St.º Sacrefício da missa, o que senão pode fazer sem que primeiro seha vezitada e approvada para o dito effeito. Pede a V. Emm.ª lhe faça mercê mandar seja vezitada e approvada na forma costumada. E R[eceberá] M[ercê].
[Despachos] O Dezembargador Bernardo Gomes Morim vezite a Capella e nos informe da sua decençia, ornamentos e dote. Lixboa Occidental a 14 de Junho de 1738. C[ardeal] P[atriaca].
P[asse] Provizão de Licença e o nosso Vigário benzerá a Irmida rezistada a escritura e dotte no Livro dos patrimonios. Lx.ª Occidental, 10 de Junho de 1738.
P[assada] P[rovizão] em 11 de Junho de 1738».

Fonte: Lisboa, Torre do Tombo, Câmara Eclesiástica de Lisboa, mç. 1808, doc. s/n

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